domingo, 13 de março de 2011

Por uma simples questão de perspectiva

Desde a época em que comecei como jovem pesquisador bolsista do CNPq  em meados dos anos 80 sempre ouço a mesma pergunta: por que a necessidade de metodologias aplicadas ao Jornalismo? A resposta não é simples e tampouco tenho a pretensão de acabar com a discussão aqui. Gostaria apenas, em primeiro lugar, de defender que o desenvolvimento de metodologias próprias é essencial para a consolidação de qualquer área de conhecimento como disciplina científica.
Permitam-me avançar com meus argumentos. Parto do pressuposto que neste espaço definimos o Jornalismo como uma disciplina científica que está interessada em definir, compreender e contribuir para o desenvolvimento da prática profissional do Jornalismo. Se aceitamos este pressuposto, como ocorre com toda disciplina científica, não deveria restar a menor dúvida de que devemos delimitar nosso objeto de estudo e estabelecer metodologias apropriadas para atingir nossos objetivos. Como a totalidade do mundo é inapreensível ao longo do tempo a prática científica adotou a divisão social do trabalho.
A criação de novas disciplinas científicas atende a demandas históricas e sociais. Nesta lógica a afirmação de uma disciplina pressupõe uma luta política para ocupação de espaços antes destinados a outras disciplinas. Quanto mais complexa a sociedade mais convivemos com uma inevitável especialização dos saberes. Um movimento contraditório porque quanto mais especializado o conhecimento mais existe o risco de perda da dimensão da totalidade que em última instância possibilita a compreensão das particularidades estudadas em cada ramo da ciência.
Desde a Modernidade e, nas sociedades atuais, o Jornalismo desempenha uma função crucial na constituição de uma esfera pública e a conquista de espaços pelos profissionais deste campo primeiro no mundo acadêmico no final do século XIX e, partir de meados do século XX na constelação das ciências, decorre antes de mais nada de que a compreensão dos enigmas de nosso tempo passa em parte pela compreensão do que é o Jornalismo, em que implica sua prática, as relações das organizações jornalísticas com as outras instituições, etc... Como objeto de estudos, como ocorre com todos os outros objetos, o Jornalismo enquanto prática profissional não é e nem deve ser monopólio dos pesquisadores em Jornalismo.
Qualquer pesquisador pode direcionar seus interesses para o Jornalismo o que, no final das contas, vai contribuir para complexificar o conhecimento sobre esta instituição social. A diferença consiste em que nenhum dos pesquisadores das outras disciplinas científicas está capacitado cognitiva e metodologicamente para formular perguntas e construir ferramentas apropriadas para descobrir as respostas sobre o que é o Jornalismo enquanto uma prática profissional. O que diferencia uma disciplina científica da outra é a perspectiva com que se debruça na árdua tarefa de delimitar o próprio objeto e elaborar suas metodologias de trabalho.
Todas as perspectivas científicas são válidas, mas o que necessita ficar claro é que nenhuma disciplina pode substituir a outra porque cada uma delas, ao partir de determinados presupostos, objetivos e adotar métodos específicos,  possibilita uma visão única sobre o Jornalismo enquanto uma instituição social. O debate continua. Na próxima postagem trataremos dos riscos de reificação do objeto e da própria metodologia.

Com um abraço,

Elias.

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